Decisão do TSE pode ser o fim da controversa carreira de Paulo Maluf na política

  • Último Segundo
  • 24/09/2014 05:11
  • Política

A confirmação da impugnação da candidatura à reeleição do deputado federal Paulo Maluf (PP-SP), pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na última terça-feira (23), pode tirar definitivamente da política uma das mais longas e controversas biografias da história política brasileira. Aos 83 anos, Maluf tem uma vida pública de 47 anos, marcada por denúncias de corrupção. O ex-prefeito de São Paulo ainda pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), mas dificilmente vai escapar da cassação da candidatura.

A Lei da Ficha Limpa, que vem tirando de circulação dezenas de caciques envolvidos em denúncias de corrupção, desta vez atingiu Maluf. Na terça, horas antes de ter a candidatura barrada, o veterano da política demonstrou preocupação, mas não deixou de fazer campanha em busca de mais um mandato de deputado.

“É uma sensação de êxito para os milhões de brasileiros que lutaram pela Lei da Ficha Limpa. Pegar um peixe grande como Maluf representa a afirmação da lei e sua capacidade de encerrar a carreira de personagens que sempre se sentiram intocáveis”, avaliou o juiz Marlon Reis, um dos responsáveis pela legislação que tornou o deputado um “ficha suja”. O Movimento de Combate a Corrupção Eleitoral (MCCE), dirigido por Reis, ronda Maluf desde 2010.

A vida desse descendente de árabe, de formação polivalente – industrial, engenheiro, empresário e político – é complexa. Integrante ditadura militar, adotado pelo ex-ministro Delfim Neto logo depois de 1964, Maluf estreou na vida pública como presidente da Caixa Econômica Federal. Mas, às vésperas do golpe, já flertava com a caserna e conspirava ao lado dos generais como dirigente classista. Ele foi presidente da Associação Comercial de São Paulo.

O fato é pouco lembrado, mas foi Maluf quem transformou a Caixa numa estatal de fomento ao mercado imobiliário. Com essa medida, ele foi catapultado pelos militares para a Prefeitura de São Paulo, em 1969. Em seguida, chegou à direção da extinta ARENA, o primeiro partido criado depois do golpe, que serviu de sustentáculo à ditadura.

Ninguém conseguiu mais segurar Maluf. Em 1978, depois de uma pesada articulação, ele se tornou governador biônico de São Paulo, vencendo numa convenção interna o próprio candidato dos militares, o ex-governador Laudo Natel. A presença no Palácio dos Bandeirantes, de 1979 a 1982, pavimentou o caminho que o levaria para a Câmara dos Deputados. O mandato como parlamentar foi o primeiro conquistado nas urnas, sendo o mais bem votado do País para o cargo na ocasião.

Desejo frustrado de ser presidente

O mandato de deputado foi desenhado como trampolim para um salto bem mais alto: a Presidência da República. Mesmo já vivendo sua trajetória ligada às denúncias de corrupção, Maluf não mediu esforços para colocar-se como candidato do partido e do regime militar na eleição indireta via Colégio Eleitoral.

Numa disputa antecedida pela vibrante campanha por eleições diretas para a Presidência, o movimento Diretas-Já, Maluf amargaria uma derrota avassaladora para o mineiro Tancredo Neves, que se aproveitou da fissura na Arena e da antipatia do último general na presidência, João Batista Figueiredo, ao candidato do PDS (antiga Arena) para antecipar o fim do regime. Tancredo morreria sem assumir o cargo, que caiu no colo do senador José Sarney.

Depois de um breve hiato, onde até ensaiou um retorno à atividade de empresário como dono da Eucatex, Maluf voltou com apetite em 1988, mas perderia a disputa pela prefeitura paulistana para a hoje deputada Luiza Erundina, que na época estava no PT. Em 1992, finalmente, Maluf conquistaria o cargo de prefeito, derrotando o senador Eduardo Suplicy (PT).

Ao deixar a Prefeitura, em 1997, Maluf voltaria a colecionar frustrações, como a eleição de seu então apadrinhado Celso Pitta – considera como uma das piores administrações da capital - e a intensa investigação que passou a sofrer em função de supostos desvios de recursos em obras superfaturadas.

Quase US$ 500 milhões no exterior

O Ministério Público paulista sustenta que Maluf tem no exterior perto de US$ 500 milhões, dinheiro que teria sido obtido através de corrupção, especialmente na época em que ele comandou a prefeitura paulistana. Parte desse valor está bloqueada e em vias de ser repatriada.

O processo o levaria à prisão, por 40 dias, em 2005 e, por tabela, colocaria definitivamente seu nome na galeria de procurados pela Polícia Internacional (Interpol) desde 2010. Isso significa que se deixar o Brasil, o deputado corre o risco de passar o resto de seus dias numa prisão no exterior.

Maluf amargou dez derrotas em quase meio século de vida pública: duas em disputa pela Presidência da República, quatro para governador paulista e quatro para a Prefeitura de São Paulo. Político de direita, justiça seja feita, sempre seguiu à risca a fidelidade partidária. Nunca trocou de partido. A sigla é que foi mudando de nome. Primeiro foi a Arena, sucedida pelo PDS, que depois se transformou em PPR, PPB e, agora, PP.

Nesta eleição de 2014, Maluf voltou a prometer a Rota, tropa de elite da Polícia Militar paulista, nas ruas, batendo na tecla da segurança pública. Mas ele agregou ao discurso uma nova bandeira, a crise hídrica que pode terminar em racionamento no Estado.

“Tem pouca água na sua torneira. E agora não adianta culpar São Pedro. No meu tempo o governo construía e resolvia. E o imposto que você paga não ia pelo ralo”, cutuca Maluf que, depois de polarizar a disputa com o PT em São Paulo, elegeu os tucanos como adversários preferenciais.

A hipótese de Maluf desistir da disputa em função da decisão do TSE é improvável. Ao contrário de fichas sujas como José Roberto Arruda, Joaquim Roriz, Jaqueline Roriz, de Brasília, ou o mato-grossense, José Riva, ele dá sinais não vai abrir mão de mais um mandato.

Há menos de dez dias, o Ibope apontou ex-prefeito com um dos líderes da corrida para deputado federal em São Paulo. Em 2010, ele ficou em terceiro na disputa pela Câmara dos Deputados por São Paulo, com 497 mil votos. Assim, o feito pode ser repito por Maluf em 2014. Talvez, pela última vez.