A COPA DAS COPAS: Pão e Circo?

  • Edmilson Sá
  • 09/06/2014 18:45
  • Edmilson Sá
Edmilson Sá
Visita ao Maracanã
Visita ao Maracanã

A Lei Nº 12.663, de 5 de junho de 2012, mais conhecida como Lei Geral da Copa, criou no Brasil, um Estado dentro de outro. Um Estado de Exceção, em que a FIFA tem autonomia irrestrita sobre vários assuntos.

Coube-nos assistir, passivamente, a instauração desse Estado de Exceção, no qual a soberania e à vontade popular – estas, explícitas, no ordenamento jurídico brasileiro – aceitando as imposições de uma instituição que, depois de lucrar muito, e, na possibilidade de futuras controvérsias, a instituição maior do futebol mundial, FIFA, é agente inimputável.

Assim sendo, como se comportar diante dessas novas prerrogativas? E na possibilidade de violência/tragédias (lembrando que bebidas alcóolicas – antes proibidas – agora serão permitidas), sobre quem recairá o dolo/culpa? Já que, como elucidado pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal – a quem caberia defender o ordenamento jurídico brasileiro –, no que se refere à Lei Geral da Copa (segundo o Ministro Luiz Roberto Barroso), foi uma decisão política. Assim, o STF julga improcedente ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade – contra dispositivos da Lei Geral da Copa:

Por dez votos a um, o Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou improcedente a ADI 4976, na qual a Procuradoria Geral da República questiona dispositivos da Lei Geral da Copa (Lei 12.663/2012). Os pontos questionados foram os que responsabilizam a União por prejuízos causados por terceiros e por fenômenos da natureza; que concederam prêmio em dinheiro e auxílio mensal aos jogadores das seleções brasileiras campeãs das Copas de 58, 62 e 70; e que isentam a Fifa e suas subsidiárias do pagamento de custas e outras despesas judiciais.

 

Alguns veem isso como uma forma de se eximir-se de responsabilidades. Contudo, esse tema merece mais atenção, para não incorrermos, não só em prejulgamentos, mas, principalmente, numa eminente omissão estatal. Que busca, única e simplesmente, satisfazer empresas, investidores e organizações estrangeiras em tempos de Copa do Mundo.

E, outras perguntas precisam, ainda, ser feitas: A Quem A Copa Mais Interessa? Quem, realmente, sairá ganhando com a Copa? Se a Copa é tão boa para o país, por que não vivermos só de Copa? Na verdade muita coisa vai parar. O Brasil vai retroceder em seu PIB. Mas, no final, o que importa é a Copa, não é? Bem, desde que a Seleção Brasileira seja campeã, tudo transcorrerá como o Governo espera. Mas, e na possibilidade do país perder, quem vai ser o bode expiatório? Esta Copa, pelo que vejo, pode definir os rumos das Eleições para Presidente do Brasil. Se nossa Seleção ganhar, o ORGULHO brasileiro, aliado aos Bolsas tudo, garantirão a reeleição – é o resultado de dois milênios de Pão e Circo. Só esqueceram de contar que há mais de 2000 anos, os Romanos, que inventaram a política do PÃO E CIRCO, já sabiam exatamente como enganar o povo – as massas – e passar a sensação de alegria e bem-estar, enquanto a fome – hoje saciada pelo pão dos Bolsas tudo – e a Alegria – representada pelo grande Circo do ano, a Copa. Essa política dá tão certo e parece longe de acabar. Mas, e se nossa Seleção perder? Esse mesmo ORGULHO do povo brasileiro, vai continuar? Vamos ter que esperar para ver...

Sei que o discurso já está batido. Mas quero deixar claro que eu não sou contra a Copa. Adoro futebol e torcerei para a Seleção Brasileira. Mas o meu ORGULHO não está nesta Seleção. Não tenho orgulho algum deles. Eu tenho orgulho do meu povo, do brasileiro trabalhador. Me orgulho em viver em um país que, apesar de novo e de uma redemocratização de pouco mais de ¼ de século, goza de uma liberdade, quase que única, em todo o mundo. Em que, apesar dos muitos problemas que vimos e vemos acompanhando, e que muitas outras manifestações de insatisfação, protesto, se acirrarão durante o período do maior torneio esportivo do mundo; a despeito disso tudo, espero que a democracia se fortaleça. Porque eu só sou contra o descaso. Não gosto de ver hospitais e escolas sucateadas. Tao pouco me sinto seguro com tamanha violência.

Direcionar toda a atenção e recursos públicos para um evento em que não trará benefícios reais algum, para a população, enquanto as reais necessidades estão à mingua, à mercê do descaso. É extremamente danoso. Mas, como estamos em ano de Eleições – não uma eleição qualquer, mas Eleições Gerais – tanto mais os recursos e o ímpeto de gastar dinheiro público (no caso dessa Copa, pelo menos 30 bilhões de reais), são como uma droga inebriante, em que contagia a todos com propagandas lindas, que evocam esse ORGULHO de ser brasileiro.

No filme Cronicamente Inviável, do diretor Sérgio Bianchi, há uma fala que cabe à discussão. Ele cita três formas de dominação, aqui só parafrasearei a primeira:

Uma perfeita forma de dominação autoritária, a “FELICIDADE”. Mas é interessante como ainda se insiste em criticar a ALEGRIA... É claro que é só inveja da “genialidade” do projeto da FELICIDADE... Enquanto o resto do mundo se força para controlar as massas, seja pelo capitalismo, socialismo, a guerra, a evolução, até o consumo; nós não... Aqui só fazemos o suficiente para gerar “FELICIDADE”... Mantemos todo mundo pobre, colocamos o som – a Copa – para tocar e pronto! ...

...Tudo bem que nós sejamos gênios, mas por que os que não querem ser “FELIZES” são obrigados a participar? Se todo mundo prefere ficar “FELIZ”, por que a gente não desiste de vez da bandeira da “Ordem e Progresso” e assume definitivamente essa ficção barata da “FELICIDADE MORIBUNDA”, podre, mijada? Essa imagem aprimorada, enlatada, que é boa pro todo mundo – Turistas, ricos, políticos. Menos para o povo.

Até que a consciência, a mentalidade, moldados pelo acesso e por uma formação educacional crítica, possam trazer novas perspectivas. Em que, se não resolvam os problemas de imediato, possa, pelo menos, provocar uma mudança de ideias e ideais. Estaremos longe de quaisquer mudanças. Não sou fatalista, nem pessimista, ao contrário, tenho esperança, muita esperança. Mas não deposito essa esperança em pessoas que só vejo pela TV. Algo tão precioso precisa está fundamentado em alguém real. Então, torcerei pelo futebol arte – aquele que encanta e faz brilhar os nossos olhos, desde as peladas de pontas de ruas, até às Copas do Mundo. Como dizia Armando Nogueira: QUE É O DRIBLE? SENÃO A ETERNIZAÇÃO DO EFÊMERO.

Me alegrarei com esta Copa. Mas espero ansioso por mudanças e melhorias substanciais em nosso país. E se as mudanças não ocorrerem, que pelo menos eu tenha mudado a mim mesmo. Tenha aprendido mais, feito mais, lutado mais, vivido mais...

CONCLUSÃO

A Copa é um fato – não só um fato social, mas jurídico também. E nós, parafraseando o grande Mário Lobo Zagalo “vamos ter que engolir”. Vemos também que precisaríamos ter discutido mais. Agora, porém, precisamos nos adequar, para que a providência, se não conseguir solucionar os possíveis problemas que advirão, durante a “Copa” das Copas, pelo menos possamos dirimir os litígios, se porventura aparecerem. E que as mobilizações sociais – sejam a favor ou contra a Copa – venham com algo de concreto. Sem discursos de Esquerda ou de Direita, sem populismos ou demagogias. E acima de tudo, sem essa violência estúpida, por parte do Estado ou dos Manifestantes. Para que possamos amadurecer como sociedade democrática.